Hoje

“Hoje”- Brasil, 2011

Direção: Tata Amaral

Sabemos que a cidade é São Paulo e o ano 1998. Mas não temos a mínima ideia de quem é aquela moça (Denise Fraga) que parece feliz, abrindo a porta daquele apartamento e que, descobrindo persianas fechadas, abre todas elas, enchendo o espaço de luz.

Ela até procura a champanhe que trouxe na bolsa e faz um brinde, bebendo na garrafa:

“- Viva!”

Sobem os homens que trouxeram a mudança e lá vai ela distribuindo móveis, abrindo caixas, até flertando um pouco com um dos homens da mudança. Ela está feliz.

Toca o telefone celular e é a irmã dela:

“- Não, por enquanto não preciso de nada, Antonia. Sim! É um velho apartamento novo. Qualquer coisa te ligo. Beijos.”

Algumas notas dissonantes indicam que ela vai ter que arrumar umas coisinhas: a torneira da cozinha, uma janela que não abre direito, o fogão não passa pela porta do apartamento…

E a síndica, vizinha de baixo, quer conversar e alertar sobre medidas de segurança que não interessam. Ela se livra dela pedindo desculpas e fechando a porta. Vira-se e se assusta:

“- O que você está fazendo aqui?”

Olham-se intensamente, o homem e ela.

“- Estás muy linda, Ana Maria”, diz ele (Cesar Troncoso) com um sotaque em portunhol.

“- Vera”, corrige ela.

Silêncio entre os dois.

“Você não vai falar nada?” pergunta ele.

“- Você também não fala nada…” responde ela.

“- Alguém tem que falar”, diz o homem.

E recomeça aquilo que não tinha acabado. No dia da mudança, Vera percebe que está muito mais mexida do que pensara e que vai ter que enfrentar aquele homem e as lembranças difíceis que ele traz para ela.

Agora se esquivando dos homens da mudança que perguntam coisas, Vera e Luis vão ter que colocar sentimentos pesados no lugar certo.

Mexendo nas memórias reprimidas, Vera dá-se conta de que precisa lembrar-se do que aconteceu para que a vida possa seguir em frente.

Tata Amaral dirige com o coração esse roteiro de Jean-Claude Bernardet, baseado no livro de Fernando Bonassi, “Prova Contrária”.

“- Rasgo o meu coração em todos os filmes, mas este é o mais íntimo”, confessa ela, que passou por coisas que a personagem de Denise Fraga também conheceu. A diretora concebeu seu filme à luz de suas próprias lembranças de vida, apesar de não ter vivenciado o período da ditadura militar no Brasil, porque era uma criança pequena naquela época.

“Hoje” traz à tona o tema dos “desaparecidos”, ligado às torturas e mortes nos porões da ditadura militar e com o que aconteceu às pessoas que tiveram que enfrentar as consequências de tudo isso.

Esse drama político, que também é uma história de amor, ganhou seis prêmios no Festival de Brasilia de 2011: melhor filme, melhor direção de arte para Vera Hamburguer, melhor fotografia para Jacob Solitrenick, melhor roteiro para Jean-Claude Bernadet, Rubens Ewald e Felipe Sholl, melhor atriz para Denise Fraga e melhor longa para a crítica.

Como veem, o filme é um trabalho de equipe que foi recompensado e que espera agora os aplausos de seu público nos cinemas.

Este post tem 0 Comentários

  1. Leda disse:

    só tenho ouvido elogios ao filme da tata amaral! a abordagem sensível desse tema sem cair em estereótipos fáceis é um consenso.
    obrigada, querida, adorei sua dica. beijos

    • Eleonora Rosset disse:

      Leda Beatriz querida,
      Pois é. Um filme brasileiro necessário, delicado e pessoal.E se preocupa com as pessoas que ficaram e sofreram com culpas. Lembrar para poder esquecer e tocar a vida pra frente! Bjs

  2. Maria Dulce Scarpa disse:

    Perfeita a descrição do filme ! É mesmo imperdível !
    Parabéns aos premiados , em especial à Denise Fraga que dá um show de interpretação!

    • Eleonora Rosset disse:

      Maria Dulce querida,
      Vc tem toda a razão! Palmas para a Denise Fraga que se entregou de corpo e alma para viver essa personagem que se esconde de si mesma e acaba se achando na revolução que uma mudança de casa faz na vida da gente. Principalmente do jeito que aconteceu com ela.
      Belo filme!
      Bjs

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