O Farol das Orcas

“O Farol das Orcas”- “El Faro de las Orcas”, Espanha, Argentina, 2015

Direção: Geraldo Olivares

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A Patagônia é uma região selvagem e bela. Altas falésias, dunas imensas e o mar azul indo e vindo com suas marés, desenhando sempre novos contornos nas pedras onde se deitam ao sol os leões marinhos, observados pelas gaivotas.

Um farol vermelho é a única construção na paisagem deserta.

Lá vive isolado, Roberto Bubas (Joaquin Furriel), biólogo marinho que escreveu um livro, “Agustín corazón abierto”, sobre suas vivências com as orcas da Península de Valdés.

Na Espanha, por causa de uma reação inusitada de seu filho autista quando assistia a um documentário sobre Beto e as orcas, sua mãe Lola (Maribel Verdú), resolveu viajar para conhecer esse lugar.

Sua esperança era que o filho, diagnosticado com a síndrome autista aos 2 anos de idade, pudesse mostrar o mesmo interesse e a alegria que ela viu acontecer frente à TV. Esperava na verdade um milagre.

Foi a primeira vez que Lola presenciou tal reação no filho e ela, que o educava sozinha, faria qualquer coisa para que isso se repetisse. Ela queria mais. Tinha a certeza que Beto e suas orcas eram o melhor remédio para Tristán (Joaquin Rapalini Olivella).

O livro de Beto conta tudo sobre essa história real e foi adaptado para o filme “O Farol das Orcas”, produzido pela Netflix.

Durante muitos anos o biólogo estudou o comportamento de caça das orcas, que se aproximam da areia da praia  para conseguir capturar leões marinhos que nadam sem ter noção do perigo que correm.

As orcas, que são conhecidas erradamente como “assassinas”, são animais inteligentes que desenvolveram esse tipo de caça unicamente naquela península da Patagônia. É uma luta pela sobrevivência, lei da natureza, quando uma espécie é alimento para a outra.

Beto não apenas observa com seu binóculo, fotografa e segue as orcas em seu bote. Ele é a prova viva de que as orcas não atacam seres humanos na natureza. Nunca houve registro de uma ocorrência desse tipo.

Mas Beto também é o “encantador de orcas”. Com sua gaita, atrai a baleia preta e branca para a praia. Fala com ela e a acaricia e sua intimidade vai mais longe. Segura a barbatana dorsal de Shaka, a fêmea mais amiga e mergulham juntos.

Quando o menino autista chega com sua mãe, Beto recebe os dois na casinha dele, pequena e repleta de desenhos de orcas, fotos, lembranças de vida e uma caixa de madeira que guarda brinquedos, que ele não deixa ninguém abrir. É um segredo íntimo de Beto que ele só vai contar para Lola, tempos depois.

O filme é belo e fala muito perto com nossas emoções. Os atores são convincentes e verdadeiramente envolvidos com seus personagens. As cenas exteriores são belíssimas, mostrando um lugar privilegiado pela natureza e protegido.

Quem gosta de animais vai adorar esse filme que fala sobre a disponibilidade e a prontidão para o amor. Beto, amante do silêncio e sem pressa para conseguir resultados, consegue milagres com as orcas e com aquela mãe desesperada e seu filho de olhar perdido. E como é bonito de se ver ele fazer isso com tanta delicadeza e respeito.

Uma frase do biólogo ressoa nos nossos ouvidos e explica a atitude dele perante a vida:

“Há pessoas que se irritam com aquilo que não entendem e outras que não querem entender o que as irrita.”

Beto era o contrário dessas pessoas.

O Rei do Show

“O Rei do Show”- “The Greatest Showman”, Estados Unidos, 2017

Direção: Michael Gracey

Primeiro em silhueta, depois num palco iluminado, o personagem da vida real cuja história vai ser contada, usa cartola, casaca vermelha e colete dourado (Hugh Jackman, excelente). Está cercado por artistas que dançam e cantam, incluindo a plateia. Todo esse show musical inicial talvez seja o número de maior impacto. Depois vai ser mais do mesmo.

Parece estranho, mas tanto as músicas (nenhuma memorável) quanto a coreografia, pertencem mais ao mundo do jazz, que não tem nada a ver com a época, nem com a história. Foi uma tentativa de introduzir modernidade em cena que deixa a desejar. No palco um espetáculo que mais parece um Cirque du Soleil menor, com estética equivocada da Broadway.

Dá saudades de “Moulin Rouge” (Baz Luhrmann) e “Cabaret” (Bob Fosse).

Mas o diretor australiano Michael Gracey, no seu primeiro longa, já mostra que pode tornar-se melhor do que já é agora, se tiver um melhor roteiro nas mãos.

“O Rei do Show” é uma leitura própria da vida de Phineas Taylor Barnum (1810-1891), que, vindo de uma família pobre, tornou-se milionário e o inventor do “showbusiness”.

Quando menino (Ellis Kubin) entrava nas casas ricas, onde tudo brilhava e encantava seus olhos, pela mão do pai que era alfaiate e atendia gente endinheirada. Foi assim que ele conheceu Charity (Michelle Williams), a mulher de sua vida.

O filme dá um salto no tempo e Barnum vai buscar Charity na casa dos pais, os Harletts (Frederic Lehne e Kathryn Meisle):

“- Ela vai voltar logo, quando se cansar da vida pobre que você pode dar para ela…” diz o pai.

E Barnum, que sempre acreditou que era fadado para o extraordinário, no começo erra muito. Chegam as duas filhas do casal e Barnum se esforça para conseguir dar a elas a vida que prometeu a si mesmo.

Vai atrás de figuras como a mulher barbada, o gigante irlandês, o menino-cachorro, o anão vestido de Napoleão e seu cavalo branco, o homem tatuado, os trapezistas negros e o público reage bem. Vem ver esses personagens tidos como monstros, escondidos da vista de todos e os aplaudem. Embora muitos digam que tudo é mera falsificação.

Mas o dinheiro e o sucesso de público parecem não ser suficientes para Barnum, que embarca numa “tournée” com uma bela cantora lírica sueca (Rebecca Ferguson, deslumbrante), largando família e o circo.

Esse é o público que ele queria em sua plateia, os aristocratas ricos e bem vestidos, em teatros exclusivos.

Ainda bem que seu sócio, Phillip Carlyle (Zac Efron, muito bom), o jovem escritor de teatro com sobrenome elegante, segura o espetáculo. Apaixonado pela trapezista negra (Zendaya), interpreta com ela o número mais bonito do filme.

Hugh Jackman é o centro de tudo e percebe-se que ele se doa ao personagem com paixão. Mas falta tempo no roteiro para que os verdadeiros conflitos apareçam. Ou seja, “O Rei do Show” é um musical. Não é um filme com números musicais. E a dupla de “La La Land”, Benji Pasek e Justin Paul, não conseguiu emplacar nenhuma canção que tenha a força de “City of Stars”.

“O Rei do Show”, com suas limitações, vale entretanto como um bom entretenimento para quem gosta de ver musicais no cinema.