Corpo e Alma

“Corpo e Alma”- “On Body and Soul”, Hungria, 2017

Direção: Ildikó Enyadi

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Na floresta branca com a neve que cai, o veado com um grande galho, seguido por uma fêmea, procura alimento. Estão próximos e serenos mas algo faz com que haja receio. Caçadores espreitam?

Mas a cena muda.

A morte é certa para aqueles outros animais que esperam com paciência e medo. O matadouro é um lugar terrível para pessoas sensíveis.  Mesmo com os olhos fechados para não ver o instante final, penso na generosidade daquela entrega. Viveram e vão morrer para alimentar a espécie humana.

Quem consegue trabalhar num tal lugar? Há mugidos roucos, barulhos pesados, luz branca e muito sangue correndo para o ralo.

Endre, uns 60 anos, o diretor financeiro do matadouro (Marc sányi Géza) não parece ser insensível à morte do gado. Mas aceita a situação como algo que não dá para evitar. Como o seu braço esquerdo que pende inerte, paralisado.

Quando Maria (Alexandra Burbély) vem trabalhar como a controladora de qualidade da carne, há reclamações de que ela está sendo injusta em suas análises.

Ela é etérea, jovem, fala pouco, rígida, responde apenas o necessário à pergunta de Endre (“são as normas”) mas algo que não é falado começa a acontecer.

Endre interroga um novato:

“- Você tem pena dos animais?”

E ao que o outro responde que não, avisa que seria melhor demitir-se. A falta de empatia pode levar a uma depressão, diz ele, levemente ameaçador.

Sándor (Revin Nagy) parece surpreso com o que fala Endre e pressente que o diretor não gosta dele.

Mas não é a intenção de Endre ser agressivo. Sente que o outro é um macho alfa e isso faz lembrar que ele fechou-se para as mulheres. Decepções amorosas o feriram. Evita, portanto, o assunto. Ou pensa que sim. Mas Maria faz aparecer ciúmes em Endre, aquele homem aparentemente frio e fechado.

Sentado no refeitório da empresa vê Maria passar.

Aqueles dois tem em comum a reserva, o receio de aproximação, a aceitação da vida sem grandes emoções, a solidão.

Mas, inesperadamente, tudo vai começar a mudar, quando uma psicóloga, chamada por causa de um roubo, interroga os empregados do matadouro.

Endre e Maria vão ficar sabendo sobre algo extravagante e inesperado.Compartilham de noite o sonho dos veados na floresta. Os impulsos animais e primitivos de acasalamento irrompem com força naqueles dois seres, até então protegidos por muros invisíveis na vida acordada. Agora são os sonhos que os conduzem.

A diretora e roteirista Ildikó Enyedi, 62 anos, ganhou a Palma de Ouro em Cannes em 1989 por seu filme “My Twentieh Century – Meu Século XX” mas depois teve que enfrentar dificuldades para filmar porque o Instituto de Cinema da Hungria acabou. Levou quase 10 anos para finalizar “Corpo e Alma”.

No Festival de Berlim desse ano, a diretora foi recompensada: Urso de Ouro, prêmio da crítica internacional e prêmio do júri ecumênico.

Unanimidade para “Corpo e Alma”, delicadeza, poesia e compaixão pela humanidade.

O filme vai representar a Hungria no Oscar 2018.

Paz, Amor e Muito Mais

“Paz, Amor e Muito Mais”- “Peace, Love & Misunderstandings”, Estados Unidos, 2017

Direção: Bruce Beresford

Jane Fonda já foi a sexy Barbarella em 1968, quando estava casada com Roger Vadim na França (1965-1973), também foi a “Hanoi Jane”, ativista contra a guerra do Vietnã, ganhou dois Oscars de melhor atriz, em 1972 por “Klute” e em 1979 por “Coming Home – Amargo Regresso”, três Globos de Ouro por esses dois filmes citados e outro ainda por “Julia” em 1978 e no último Festival de Veneza levou um Leão de Ouro, como prêmio por sua carreira. Sem falar das inúmeras indicações ao Oscar.

Sua história no cinema, que começou em 1960, está em plena atividade, tendo atuado em 2015 no filme “A Juventude” de Paolo Sorrentino, numa ponta muito comentada, fazendo uma atriz decadente, que fez ela ganhar mais um Globo de Ouro. Na Netflix, “Our Souls at Night – Nossas Noites” de 2017, marca um enorme sucesso, fazendo par com Robert Redford.

A atriz, em ótima forma, completa 80 anos hoje, dia 21 de dezembro e por isso, coloco no meu blog o filme “Paz, Amor e Muito Mais” de 2011 que está passando na Netflix. Ela faz uma avó hippie que mora em Woodstock e tem uma plantação ilegal de maconha no porão.

Não é um grande filme mas ver Jane Fonda de cabelos grisalhos e longos, saias coloridas e um sorriso de felicidade no meio de suas galinhas, cartazes para as manifestações pacifistas na praça da cidadezinha e conhecendo seus netos que não via desde que nasceram, é um prazer.

Grace, a avó hippie, também não vê a filha desde que ela se casou há 20 anos atrás e flagrou a mãe vendendo baseados no seu casamento.

Agora, Diane (Catherine Keener), divorciada, vai ser gentilmente empurrada para tirar o terninho de advogada bem sucedida e deixar rolar a parte afetiva que ela trancou durante muito tempo.

Os netos terão que ser estimulados pela avó a vencer barreiras para poder se entregar a primeiros amores. E tudo acontece com aprovação da avó amorosa e divertida que estimula os jovens a se libertar e fazer o que o coração manda.

Jane parece se divertir fazendo essa avó de Woodstock que adora “desencaminhar” os netos e a filha tão exageradamente politicamente corretos.

O diretor também parece se divertir acompanhando Jane Fonda, a filha, a neta (Elizabeth Olsen) e o neto (Nat Wolff) e seus romances. Porque como já cantavam os Beatles: “Ally you need is love!”

Vamos celebrar os 80 anos de Jane Fonda e desejar uma bela continuação de carreira porque não podemos passar sem ela!