Pinóquio

“Pinóquio”- “Pinocchio”, Estados Unidos, 2022

Direção: Guillermo del Toro

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Quem nunca ouviu falar de um boneco cujo nariz crescia a cada vez que mentia? Esquece. Porque o Pinóquio do mestre do cinema, o mexicano Guilermo del Toro de “O Labirinto do Fauno” e ”A Forma da Água”, é diferente daquele criado por Carlo Collodi em 1883.

Escrito a quatro mãos, o roteiro de del Toro e Patrick McHale, traz  um Pinóquio mais alegrinho, mais parecido com uma criança real. Mas é uma história para adultos. Se bem que crianças também podem ver.

Talvez seja sombrio em certas passagens. Mas é a vida.

Perdas. Temos que enfrentá-las.

Há uma elaboração de alguns temas como os regimes autoritários (fascismo na Itália), perder-se em sonhos de grandeza, ingratidão e remorso. Culpa também. E desobediência, quando necessária.

Trata-se de perguntar: o que nos faz humanos? O grilo falante resume bem: “Esta é uma história de pais imperfeitos e filhos imperfeitos.”

Guillermo del Toro focaliza aqui pricipalmente essa relação. Gepeto tem um filho de 10 anos, Carlo, que é só amor e juizo. Quando uma bomba de um avião da Primeira Guerra atinge a igreja local, Carlo morre e deixa Gepeto desacorçoado e bravo. Entrega-se à bebida.

O luto que o pobre pai enfrenta é colossal. Nada mais lhe resta nessa vida além de visitar o túmulo do filho morto.

Então, a chegada do filho de madeira, um marionete sem fios, é uma benção para o velho marceneiro. Há luz novamente em seus olhos que querem ver um Carlo ressuscitado.

Há uma identificação quase que imediata com o personagem, porque apesar de não ser o filho perfeito, há uma alegria em Pinóquio que faz lembrar como fomos também crianças, com aquele encantamento divertido do boneco hiperativo e total falta de foco.

O grilo falante é o personagem que conta a história. É um intelectual. Um escritor pernóstico. Sendo pequeno, o menor de todos, tem que cuidar para não ser amassado o tempo todo.

A fada azul virou um cruzamento de esfinge e anjo e dá vida a Pinóquio, para que ele encha de luz a vida do pobre Gepeto. É a única voz feminina. Não seria a mãe de Carlo, que aparece para consolar Gepeto? Ela pede ao grilo que ajude Pinóquio a evitar o mau caminho.

Bem, isso só vai acontecer bem mais tarde, quando Pinóquio experimentar e aprender. Afinal ninguém nasce sabendo.

A animação (stop-motion) tem tantas belas imagens que é impossível não se encantar. E as vozes de atores talentosos criam e recriam personagens na história de Pinóquio. Assim, David Bradley (Gepeto), Gregory  Mann (Carlo e Pinóquio), Ron Perlman (o fascista), Ewan McGregor (o Grilo), Tilda Swinton (Esfinge turquesa), Cate Blanchett (Spazzatura, o macaco).

Alexandre  Desplat, compositor e maestro, assina a música, tanto a orquestrada quanto as canções, momentos de beleza e brincadeira.

Essa nova versão da história tão conhecida tem menos pesadelos e mais sonhos realizados. Um alívio nesse mundo de decepções em que vivemos.

Ardente Paciência

“Ardente Paciência”- “Ardiente Paciencia” Chile, 2022

Direção: Rodrigo Sepúlveda

O mar verde/azul da Ilha Negra, na costa chilena, inspira o poeta que vemos caminhando pela orla.

Pablo Neruda, que já tinha sido diplomata, escolheu morar nesse lugar agreste, numa casa debruçada sobre o mar. Mas a situação política no Chile o preocupa. É 1969 e haveria eleição para Presidente da República, muito importante para o povo mais pobre do Chile.

Na mesma ilha, o jovem Mario Gonzalez (Andrew Bargsted) volta da pesca e vende seu peixe que compra o pão das famílias da ilha. Ser pescador era a única opção. Como seu pai, ser pescador era o seu destino.

Mas Mario explica para a mãe que não queria ser pescador. Com sua bicicleta, iria procurar outro trabalho.

Mario não sabia mas esse dia seria o mais importante em sua vida. Vislumbra Beatriz (Vivianne Dietz) limpando as vidraças da Hospedaria Santa Helena. Foi um momento mágico. Mario ficou seduzido para sempre.

E outro encontro que mudaria sua vida ia acontecer no mesmo dia. O Correio precisava de um carteiro. Mario, com sua alegria e prontidão, aceita o cargo e já segue rápido na direção da casa do habitante mais famoso de Isla Negra. Ia deslumbrado porque conhecer o poeta era um sonho mas também se preocupava. O poeta iria gostar de conhecê-lo?

E foi a amizade com o poeta que fez Mario descobrir sua verdadeira profissão: carteiro de Pablo Neruda. Ele era o único que recebia cartas na ilha.

E quando Mario abriu seu coração e contou que estava apaixonado por Beatriz, Neruda (Claudio Aradondo) pergunta: “Como em Dante? Mulheres com esse nome inspiram amores ardentes.”

E a “ardente paciência” vai ser necessária para Mario conseguir chegar perto da amada.

E quando vem o telegrama convocando Neruda para candidatar-se à Presidência da República, Mario vai entender o desapego do amigo por poder.

O filme de 2022 foi adaptado do livro “Ardente Paciência” pelo próprio autor, Antonio Skármeta e Guillermo Calderón.

O livro foi escrito em 1983. E o próprio autor dirigiu o primeiro filme em Portugal, onde estava exilado. Ganhou muitos prêmios.

Em 1985 Skármeta mudou o nome do livro para ”O Carteiro de Pablo Neruda” que fez muito sucesso e foi novamente adaptado para o cinema com direção de Michael Radford em 1994 com o nome de “Il Postino” que ganhou cinco Oscars.

Em 1971 Neruda ganhou o Prêmio Nobel de Literatura, morrendo em 1973, com 69 anos.

“Confesso que Vivi” foi seu último livro.