Peter Pan

“Peter Pan” – “Pan”, Inglaterra, Estados Unidos, Austrália, 2015

Direção: Joe Wright

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Peter Pan é um personagem que sempre me encantou. Corajoso, galante, brincalhão. Chapeuzinho verde com uma pena, túnica meio esfarrapada, cinto e espada de madeira. Eu vestia a fantasia e fingia voar, como ele.

Para a menina que eu era, imaginativa e ávida por aventuras, o mundo da minha casa se ampliava quando eu brincava que era Peter Pan.

E é esse o ângulo que Joe Wright escolheu para fazer seu filme, uma homenagem à imaginação e ao sonho, que nos faz escapar de um mundo de realidade muito estreito.

O escritor que criou Peter Pan em 1904, o escocês J.M. Barrie (1860-1937), ajudou muitas crianças que viviam vidas sem graça, ou mesmo infelizes, a viajar com o menino voador para a Terra do Nunca, onde existiam fadas luminosas, belas sereias, crocodilos gigantes, florestas encantadas, piratas e índios.

Mas faltava uma coisa nessa ilha encantada: uma mãe.

O inglês Joe Wright, 43 anos, quer contar de onde veio Peter Pan, como nasceu o menino que não sabia que podia voar. Como todo órfão, o que mais fazia falta em sua vida, no lar de crianças abandonadas, era o carinho de sua mãe.

Nas primeiras cenas, vemos quando ela (Amanda Seyfried), abandona o bebê na porta do orfanato e coloca em seu pescoço a correntinha com a flauta e uma carta.

Doze anos depois, durante a Segunda Guerra, bombas caem sobre Londres e Peter sofre nas garras de uma freira que parece bruxa. Para uma criança sem mãe, todas as mulheres são inferiores e más, porque com sua presença denunciam a ausência daquela única que poderia amá-la de verdade.

E Peter sonha. E em sonhos vai para a Terra do Nunca, lugar da Mãe. Ele tem a certeza de que vai encontrá-la.

Na carta que ela deixou está escrito: “Não duvide de si mesmo. Você é extraordinário. Mais do que imagina.”

Escolhendo um registro psicológico, Joe Wright faz das angústias de Peter e de sua fuga da realidade através do sonho e da imaginação, o material para construir a Terra do Nunca, para onde se vai num navio que voa, porque ela está no meio das nuvens do céu. E lá Peter Pan vai descobrir quem é seu amigo e seu inimigo (Gancho e Barba Negra, substitutos paternos), conhecer sua verdadeira história e descobrir quão extraordinário ele realmente é. Uma mensagem que toda criança precisa ouvir.

Joe Wright valeu-se do 3D de forma criativa, os cenários com as cores do arco-íris inventam um lugar de fantasia, maravilhas e perigos, ameaças e descobertas.

O elenco é ótimo, destacando-se o australiano Levi Miller que interpreta Peter Pan com valentia e ingenuidade, Hugh Jackman que faz o Barba Negra, vilão com toque de alta costura e o Gancho de Garret Hedlund, simpático e malandro. Sem esquecer da princesa Tiger Lily ou Tigrinha, valente e encantadora (Rooney Mara).

Joe Wright, de “Desejo e Reparação”2007 e do luxuoso “Anna Karenina”2012, mostra novamente que o cinema, quando bem feito, mexe com nossas memórias mais antigas, funcionando como uma “máquina do tempo”que desperta a criança eterna lá dentro de nós.

Por tudo isso, “Peter Pan” vai agradar pais e filhos.

Perdido em Marte

“Perdido em Marte”- “The Martian”, Estados Unidos, 2015

Direção: Ridley Scott

Um alvorecer banha o planeta de vermelho e descortina uma planície de solo amarelado e picos de pedra negra. Aqui e ali vemos homens trabalhando, vestidos em trajes espaciais, que se comunicam entre si, através de um sistema embutido em seus capacetes. Perto, uma base, onde há um laboratório onde se estudam as amostras colhidas.

De repente, soa um alarme. Sinal de tempestade.

“- Estaremos lá dentro antes disso”, diz um dos homens.

Mas parece que a tempestade é pior do que eles pensavam. E todos se apressam para subir na nave pousada perto. A missão em Marte terá que ser abortada. A luz quase desaparece e só distinguimos vultos batidos por uma pesada chuva de detritos.

Dentro da nave aprontam-se para decolar e alguém informa que Mark Watney (Matt Damon) está morto. Não há sinais vitais dele na tela de monitoramento. Depois de hesitar, a comandante (Jessica Chastain) dá a ordem para a decolagem.

A nave Ares III se lança no espaço, sem ninguém imaginar que Mark Watney (Matt Damon) está vivo e, de agora em diante, sozinho em Marte.

Ridley Scott, 77 anos, é o diretor de muitos filmes que marcaram época. Basta lembrar de “Alien”1979, “Blade Runner”1982, “Thelma e Louise”1991, “Gladiador”2000 e outros menos apreciados mas grandiosos, “Prometheus” 2012, que terá uma sequência e “Exodo: Deuses e Reis”2014.

Baseado no livro de Andy Weir, um programador de computador que escreveu e publicou “on line” e depois viu seu livro tornar-se um “bestseller”, o filme tem roteiro inteligente de Drew Goddard. O grande tema é a ciência e como ela consegue dar respostas às perguntas que Mark levanta para resolver os problemas ligados à sua sobrevivência em Marte.

Fiel ao livro, o filme coloca as questões científicas, que estão rigorosamente corretas, de forma mais acessível para o público entender, quando Mark faz anotações no seu diário digital.

Matt Damon interpreta o papel com perfeição e sua simpatia natural empresta encanto ao personagem que não se deixa derrotar por dificuldades que desanimariam qualquer um. Ele vai resolvendo com calma, humor e tenacidade, cada passo em direção à sua sobrevivência. Sobrepuja a solidão e o medo, fazendo a cabeça funcionar em prol de si mesmo. É um campeão da resiliência, que é a capacidade de retornar ao estado anterior, ainda mais fortalecido, depois de passar por adversidades.

E há a solidariedade na Terra, com os cientistas procurando resolver o problema de mandar uma missão de socorro para trazer Mark de volta. Por mais difícil e improvável que isso pudesse ser.

A trilha sonora de “Perdido em Marte” é um achado delicioso. Mark ouve música dos anos 70 o tempo todo, já que é a única disponível, deixada pela comandante da nave no meio de suas coisas na base. Gloria Gaynor encerra o filme com seu hino “I Will Survive” que nunca esteve tão bem aproveitado.

Ridley Scott, altamente inspirado, fez um filme que prende a atenção, cria paisagens belíssimas e exalta as boas qualidades da natureza humana.

Estamos muito precisados disso.