O Impossível

“O Impossível”- “Lo Impossible” Espanha, 2012

Direção: Juan Antonio Bayona

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Tudo convidava à felicidade das férias, em um dos lugares mais bonitos do planeta, a ilha de Pukhet na Tailândia.

A família Bennet, depois de um voo vindo do Japão, onde moravam, chega ao paraíso, um resort na Orchid Beach. Águas turquesa, areia branca e um sol luminoso acolhem a mãe Maria (Naomi Watts), o pai Henry (Ewan McGregor) e seus três filhos, Lucas de 12 anos (Tom Holland), Thomas de 7 (Samuel Joslin) e Simon de 5 (Oaklee Pendergast).

Tinham vindo passar os feriados do Natal.

Por ironia do destino, a suíte do 4º andar que os teria salvado do pior, foi substituída, na última hora, por uma suíte à beira-mar, de onde se viam palmeiras e um mar azul.

Estavam todos animados com o “up grade” e o Natal foi feliz. Não sabiam o que os esperava…

Ficamos com o coração apertado pois sabemos o que vai acontecer. E quando vem, sem aviso, surge a impotência do ser humano frente à força implacável da natureza. Não dá para esboçar um gesto. Só se encolher como Maria faz.

A força de vida do ser humano que o faz sobreviver, apesar das adversidades, é espantosa. Belíssima a cena em que Maria, atingida pelos detritos de toda sorte, quando é tragada pela onda do tsunami, desfalece, seu corpo flutua e, em câmara lentíssima vemos seu braço que rasga a água e faz acontecer o encontro com o ar abençoado, seu corpo vencendo a morte e tragando a vida, numa respiração vitalizante,

Todo mundo viu fotos, filmes na TV, ouviu depoimentos dos sobreviventes mas nada como o cinema para nos colocar em lugares onde nunca estivemos e sentirmos o que os outros sentiram.Quando o roteiro, a atuação, os efeitos especiais são de primeira linha, como em “O Impossível”, passamos todos pelo horror que foi o tsunami de 2004, que matou milhares de pessoas, um dia depois do Natal.

Vestimos a pele daqueles que passaram pelo terror e morreram (cerca de 300.000) e sofremos com os sobreviventes, separados de suas famílias e vagando desesperados entre os destroços do paraíso.

Naomi Watts está de arrepiar como a médica despreocupada, em férias, que se transforma na mãe sofrida e tão mais próxima do filho mais velho, que a ajuda a vencer com coragem a batalha pela sobrevivência. Foi indicada para melhor atriz em todos os prêmios que já foram anunciados. O jovem Tom Holland também está perfeito no papel.

O impossível aconteceu. E Maria Belón, espanhola, escreveu um livro contando essa história de pesadelo que passou na Tailândia com sua família e que foi adaptada para o cinema.

“O Impossível” não é um filme em que o desastre é o ator principal. Aqui, a câmara foca em planos abertos a primeira e a segunda onda e os destroços em que se transformou aquele pedaço de paraíso. Mas não é o principal. O diretor Bayona prioriza os rostos feridos, as pernas trôpegas, os olhares cansados , o trauma vivido naquela manhã.

Mostra o ser humano em uma situação de exceção. Vemos gestos egoístas e solidariedade, a emoção do reencontro e as lágrimas da perda dos seres queridos.

“O Impossível” é um belo e terrível filme sobre o imprevisível.

 

 

 

 

As Aventuras de Pi

“As Aventuras de Pi”- “Life of Pi” China, Estados Unidos, 2012

Direção: Direção:Ang Lee

Todo mundo gosta de ouvir histórias, desde criança. Elas ficam na nossa cabeça e inspiram outras histórias. É o destino delas.

Mas quando quiseram fazer um filme com “As Aventuras de Pi”, algo estranho aconteceu. Muitos diretores tentaram fazer esse filme mas desistiram. Parecia que a história imaginada pelo brasileiro Moacyr Scliar, “Max e os Felinos”, e que inspirou Yann Martel para escrever o livro “As Aventuras de Pi”, era impossível de ser posta em imagens. Muito filosófica…

A história precisava de um mestre em imaginação e soluções mágicas. E ele apareceu.

Ang Lee, nascido em Taiwan e radicado nos Estados Unidos, o cineasta de 58 anos que já fez cowboys se amarem, apaixonou-se por essa história e criou para ela um mar que reflete nuvens e se mistura com o céu e à noite brilha à luz de plânctons e peixes fosforescentes.

Dentro de um bote, depois de um naufrágio no qual perdeu toda a família, um garoto indiano tem um tigre como companheiro de viagem. Mas como foi difícil chegar nesse ponto…

Essa história simples inspira muitas reflexões. Quanto alguém precisa sofrer para desacreditar de tudo, de sua fé, de sua esperança, de sua vontade de viver? Um animal selvagem pode ser um desafio e transformar-se em um estímulo? Quanto amor próprio é necessário para alguém não abandonar-se à própria sorte? Ou é tudo uma metáfora sobre a culpa e de como nos fazemos mal, até domá-la com carinho e aceitar a vida como ela é? E assim por diante. Cada um vai fazer uma pergunta diferente.

No bote, os dias são longos e quando o mar é um lago, Pi e o tigre satisfazem parcamente suas necessidades básicas com peixes e água da chuva. Mas, frente ao mar revolto, de ondas assassinas, Pi e o tigre Richard Parker estão entregues à fúria do vento, raios e trovões de uma tempestade que os coloca à mercê da natureza. Trocam olhares assustados e se viram como podem. Estão juntos, iguais, o menino e o tigre com nome de gente.

Ang Lee, o brilhante diretor que já ganhou um Oscar com “O Segredo de Brokeback Mountain” e outro de melhor filme estrangeiro com “O Tigre e o Dragão”, usa o roteiro perfeito de Yann Martel e a fotografia de Claudio Miranda para nos fascinar com imagens de sonho.

É tudo digitalização e cenas em estúdio? Não importa. Ang Lee captura os nossos sentidos e cria surpresa e encanto. Usado com naturalidade, o 3D não é muito notado porque faz parte de um mundo criado pelo diretor.

A trilha sonora de Mychael Danna ressoa os sentimentos que se passam no coração de Pi e nos embala na magia das cenas que se sucedem, uma mais linda que a outra.

Shuraj Sharma interpreta o menino Pi com uma naturalidade que só um novato conseguiria, pensou acertadamente o diretor, ao escolhê-lo dentre os 3.000 candidatos. E é só ele e o tigre a maior parte do tempo,

vivendo uma história que nos prende a atenção e nos faz torcer por um final feliz.

“As Aventuras de Pi” é um filme para crianças e adultos.

Entreguem-se de corpo e alma à essa obra-prima, sem medo de errar.