Selvagens

“Selvagens”- “Savages”, Estados Unidos, 2012

Direção: Oliver Stone

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O. é bela e loura como a Ophelia de Shakespeare, a quem deve o nome e a atração por tragédias. Ela vai viver algumas em “Selvagens”, umas reais, outras sonhadas.

Ela (Blake Lively), tem dois namorados, amicíssimos desde pequenos, Chon (Taylor Kitsch) e Ben (Aaron Johnson) e divide com eles uma vida de sexo, drogas e muito sol nas belas praias da Califórnia.

O. é a narradora do filme “Selvagens”, dirigido pelo mestre Oliver Stone, que sai dos temas políticos e visita o cinema de aventura e romances nada burgueses.

“- Só porque estou contando uma história, isso não quer dizer que estarei viva até o final. Essa é uma aventura arriscada porque as coisas saem fora do controle. Tudo começou em Legend Beach,” conta O. em “off ”.

Uma casa nos rochedos acima dos verdes e azuis do mar, quebrando numa praia idílica. Um pelicano sobrevoa a paisagem e uma loura está fumando maconha naquele terraço.

“- Chon, quer? “ oferece ela a um rapaz queimado de sol.

No laptop, a tela ensanguentada mostra cabeças cortadas.

“- É o Iraque?” pergunta O.

“- Não. México”, responde Chon.

Pessoas assustadoras usando máscaras de caveira e um aviso na tela:

“Não sejam burros como eles.”

Em “off” ouve-se O. dizendo:

“- Chon e Ben plantam a melhor maconha do mundo.”

Ora, é exatamente por causa desse negócio deles, “uma lenda urbana”, como diz O., que as coisas vão mesmo sair do controle.

O cartel Baja, chefiado por La Reina Elena (Salma Hayeck), que comanda mexicanos de maus bofes, vai se meter com os rapazes, que não aceitam associar-se a eles. Benicio del Toro, fazendo um sujeito sem escrúpulos, grosseiro e mau, o vilão Lado, vai dar trabalho.

Mas O. adianta para nós:

“- Ben tem uma filosofia 100% budista. Mas Chon é “maudista”! Não brinquem com ele!”

E acrescenta:

“- Chon é metal frio e Ben é madeira quente. Ben é o espirito, Chon é a terra. A única coisa que eles tem em comum, sou eu.”

Com a ajuda de Dennis (John Travolta), agente policial que sempre encobriu seus negócios ilegais, os rapazes de O. vão ter que sair de sua vida mansa para salvar os lucros, a pele e o que eles mais amam, a loura Ophelia.

“Selvagens” prende a atenção com uma história de ação bem contada, violência e cores lisérgicas.

Sam Winslow, autor do livro, vendeu os direitos para Oliver Stone e colaborou no roteiro.

O “Selvagens” do título do filme é um convite a pensar. Como o conceito é relativo, os mexicanos acham “selvagem” o “ménage à trois” dos americanos , ao passo que eles olham com horror o método mexicano de resolver conflitos.

Embalado por uma bela trilha sonora que tem a delicada voz de Yuma cantando “Here Comes the Sun” dos Beatles, vá ver o filme, que pode agradar a todos, selvagens que somos todos nós por natureza, cada qual à sua maneira.

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Rota Irlandesa

“Rota Irlandesa”- “Irish Route”, Reino Unido, França, Bélgica, Itália, Espanha, 2010

Direção: Ken Loach

 

Um homem jovem, que parece muito perturbado, está numa balsa que cruza um mar cinzento. O grito das gaivotas se mistura, em sua cabeça, com as últimas palavras de seu amigo, ouvidas em mensagens deixadas em seu celular. Mensagens de socorro que ele não ouviu a tempo…

Lembra-se deles dois, nessa mesma balsa, anos atrás, felizes, sonhando em conhecer o mundo, viajar para lugares distantes da Liverpool, onde nasceram e cresceram juntos. Como irmãos.

Nunca mais.

Fergus (Mark Womack, ator emocionante) pensa em Frankie (John Bishop), que ele convenceu a ir para o Iraque, para trabalharem juntos como mercenários, em uma empresa de segurança. Ele voltou mas seu amigo…

Ao entrar na igreja onde será feito o serviço fúnebre, é atacado por uma moça loura (Andrea Lowe), que grita:

“- Eu odeio você! Você matou Frankie!”

Seu belo rosto desesperado está tão pálido como o do amigo Fergus. Rachel era a namorada de seu querido Frankie, que ele nunca mais verá.

“- Eu preciso vê-lo”, implora Fergus.

“- Mas o caixão está lacrado. Seu amigo foi muito ferido, muito machucado… Sinto muito…”, diz o responsável.

Quando as luzes se apagam na igreja, Fergus abre o caixão com um pé de cabra e procura a mão do amigo.

“- Frankie, o que fizeram com você?”

O que Fergus vai fazer? Vingar-se. Ele vai atrás, para descobrir o que aconteceu com seu amigo no Iraque, na chamada Rota Irlandesa, a estrada mais perigosa de Bagdá.

Mas nada vai adiantar porque o luto de Fergus é um luto impossível. A culpa o persegue desde que voltou da maldita guerra. O pesadelo recorrente, que mostra a menina quase morta apontando um dedo acusador para ele, não o deixa dormir.

Ele mora em um apartamento que parece um acampamento. Uma cama de campanha, um computador sobre uma mesa. Na verdade, ele não voltou do Iraque. Sua alma ficou lá.

“- Eu só queria ter de volta quem eu era…” soluça ele para si mesmo.

Ken Loach, o premiado diretor de “Ventos da Liberdade”, faz em “Rota Irlandesa” um filme sobre a impossibilidade de alguém voltar ileso de uma guerra.

Com cenas reais de morticínios no Iraque, Loach e o roteirista Paul Laverty, alertam para o horror da guerra que é mostrada ao vivo.

O desespero de todos e a culpa, que não deixa viver, são o mais forte libelo contra a insanidade e a barbárie.

Quando é que vamos acabar com essa loucura? Essa é a pergunta do filme “Rota Irlandesa” que os homens ainda não escutaram.

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