Tudo bem não ser normal

"Tudo bem não ser normal" - "It is ok not to be ok" , Coreia 2020

Direção: Park Shin Woo

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A famosa escritora de contos de fadas para crianças vai ler seu último livro num hospital, na ala infantil, numa tarde de autógrafos. Lá a esperam seus fãs. Mães e filhos.

Ko Mun-yeong (Seo Ye- Ji) é jovem e bela. Seus brilhantes cabelos longos e negros fazem um lindo contraste com a pele perfeita e muito branca. Ela é dona de uma postura elegante e sabe escolher roupas que valorizam seu corpo esbelto, pernas longas e cintura fina. Está sempre “over dressed” mas é uma delícia acompanhar o desfile dela com roupas únicas, sapatos e bolsas originais e jóias de extremo bom gosto.

Ela ainda não sabe mas aquele rapaz bonito e tímido, Moon Gang-tae ( Kim Soo-yun ) que a olha de muito perto no jardim, com pétalas de cerejeiras caindo sobre os dois, vai ocupar um lugar importante em sua vida.

Muitos obstáculos os separam e ela vai ter que se lembrar da mãe, maldosa e egoísta, que a moldou segundo seus critérios de como viver a vida e também do pai que sempre lia contos de fadas para ela. Só que ela vai ter que aprender a ser gente e não uma princesa de um livro em branco.

Ao longo dos 16 episódios vamos conhecer também o irmão mais velho do rapaz encantado com a escritora, Moon Sang- te ( Oh Jeong- Se ), que é autista. Ele adora desenhar e vive grudado no irmão mais novo. Morre de ciúmes dele.

Os dois irmãos são orfãos e o mais novo sempre pensara que ele havia nascido para cuidar do irmão mais velho. E era o que fazia com carinho.

Uma cena de uma chuva de pétalas de rosa sobre o rapaz, que era cuidador no Hospital Psiquiátrico OK, nos fala sobre o quanto ele era amado por todos e lembra a cena de um filme,“ Beleza Americana”. Vamos ver outras citações que homenageiam o cinema durante a série.

O diretor sul-coreano Park Shin Woo que assina os episódios se esmera na beleza das cores e nos movimentos da câmera.

A música, muito bem escolhida, nos envolve mas não o tempo todo. Entre canções melodiosas e rock, tem até uma “ Pour Elise” assoviada.

Há um flashback importante que nos leva para a infância da escritora e dos dois irmãos. Um acidente no lago gelado vai ser um trauma na vida dos irmãos e uma lembrança de um ato raro na vida da escritora.

“ Tudo bem não ser normal” é uma série que ensina como o orgulho e o egoísmo trazem sofrimento para quem não percebe como humilha os outros e isola as pessoas que se comportam dessa maneira. E nos faz refletir como a generosidade atrai felicidade.

Para vocês ficarem ainda mais curiosos sobre a série cito alguns dos títulos dos episódios: O menino que se alimentava de pesadelos, A mulher de sapatos vermelhos, O garoto zumbi, Rapunzel e o castelo amaldiçoado, O segredo do Barba Azul, O cão feliz e muitos mais. Não são convidativos?

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Mank

“Mank”- Idem, Estados Unidos, 2020

Direção: David Fincher

Um céu com nuvens brancas, tons de cinza e branco, serve de fundo para os créditos do filme que continuam aparecendo quando a câmera foca a estrada poeirenta abaixo. Estamos no sul da Califórnia, no deserto. Dois carros trazem o roteirista e crítico de teatro, Herman J. Mankiewicz (1897-1953) e seu séquito, ele usando muletas, devido a um fêmur quebrado. O destino é o Rancho Verde.

Mank, como todos o chamam, será o personagem principal de uma história sobre o homem que escreveu o roteiro de “Cidadão Kane”, “O Mágico de Oz” e “Os Homens Preferem as Louras”, na Hollywood da década de 30/40.

Vamos ver o que aconteceu naquele quarto, onde Mank (Gary Oldman, extraordinário), se refugia, deitado numa cama, ditando para a secretária Rita (Lily Collins), jovem inglesa eficiente e bela, o que viria a ser o roteiro do filme “Citizen Kane”.

O telefone toca e Orson Welles (1915-1985), aos 24 anos, cobra pressa no trabalho, diminuindo o prazo de 90 para 60 dias. O “Wonderboy”, que vinha de sucessos no teatro e no rádio, tinha carta branca da RKO para fazer seu primeiro filme do jeito que quisesse e com quem escolhesse.

Mank só funcionava sob efeito de muito álcool e diziam, Seconal, fornecidos por Welles. Veremos o roteirista se debatendo entre o passado e o presente em memórias de Holywood onde figuravam os donos de estúdios e colegas roteiristas, atores e atrizes, em “flashbacks” que chegam a desnortear o espectador. Porque tudo se passa em meio a intenso falatório, ironias, fumaça de cigarros e charutos, em plena crise no país.

Mas não se assustem. Mesmo não sabendo quem é quem, conseguimos entender a história.

E um dos “flashbacks” traz Mank nos domínios do magnata da mídia, William Randolph Hearst (Charles Dance), onde estão também o chefão da MGM, Louis B. Mayer (Arliss Howard) e a louríssima estrela Marion Davies (Amanda Seyfried), amante do dono de San Simeon, propriedade surreal, onde passeavam girafas e elefantes, num zoológico privado.

O magnata, quem Mank adorava e depois veio a odiar, será o personagem central de “Cidadão Kane”. Escrito o roteiro, Orson Welles disse que usou o que queria e colocou novas cenas imaginadas por ele, tornando-se assim, portanto, o co-autor do roteiro. Afinal, o filme é do roteirista ou do diretor?

O roteiro de “Mank”, escrito por Jack Fincher, antes de sua morte em 2003, foi filmado como uma homenagem do diretor David Fincher a seu pai.

O diretor de “Mank” 58 anos, já recebeu 30 indicações ao Oscar, duas delas para melhor diretor. Pode ser que venha agora o tão merecido prêmio para quem dirigiu filmes como “O Clube da Luta”, “Zodíaco”, “Seven”, “Garota Exemplar”, “”Millenium – A Garota com a Tatuagem de Dragão” e séries de sucesso na Netflix como “MindHunter”.

Certamente Gary Oldman já é um forte candidato a melhor ator. E o filme já está na Netflix.

Vale lembrar que “Cidadão Kane” foi indicado para 10 Oscars e só levou o de melhor roteiro, que Mank teve que dividir com Orson Welles. Prestem atenção na última cena de “Mank” onde o próprio, empunhando o seu Oscar, fala o que pensa com a ironia fina que sempre usou para encarar a verdade.

Surpreendente.

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