Chico – Artista Brasileiro

“Chico – Artista Brasileiro” – Brasil, 2015

Direção: Miguel Faria Jr

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Como se estivéssemos sentados no teatro, vemos as luzes se acendendo aos poucos no palco, os músicos se colocando em seus lugares, as cores se acentuando e Chico, de blazer vermelho, entra. Assobia “Sinhá”, letra dele, música de João Bosco. Um coro de cantores negros acompanha Chico, num fundo amarelo, ensolarado.

E pronto. O coração entra no ritmo desse documentário dirigido com talento por Miguel Faria Jr, que conta Chico pelo próprio Chico.

As montanhas do Rio, vastas na neblina e Chico fala sobre memória e imaginação, de como nos lembramos de coisas que não vimos:

“- Eu vi o Zeppelin, no colo de minha avó, sobrevoando a Baia de Guanabara. Não. Não vi não… Criei essa imagem na minha cabeça. Eu a vi e ficou minha.”

Ele trabalha com essa matéria prima, tanto nas músicas quanto nos textos dos livros.

Entra a voz de Miúcha, irmã mais velha, que já não está entre nós, lendo um trecho do “Irmão Alemão”, último livro de Chico, (“…para mim as paredes eram feitas de livros…”), que serve como introdução para ele falar do pai, o historiador Sergio Buarque de Holanda de “Raízes do Brasil”. Um pai atarefado com seus escritos, que não tinha uma boa relação com o filho, que é criada através dos livros:

“- Peguei mania de ler em francês por causa do meu pai.”

Vemos fotos de infância, ele e os irmãos, a temporada na Itália com a família, onde Chico estudou num colégio americano, um retrato dele com um bilhete para a avó, a vinda da família para São Paulo na casa da Rua Buri.

E o Festival da Record em 1966 com “A Banda”. Sucesso. O público aplaudindo e cantando junto com Chico e o MPB4. A mãe dele, dona Maria Amélia, sobe ao palco trazida pelo filho de 22 anos:

“- Minha mãe tinha um pouquinho de vergonha de ter filho no “show business”…”

E foram até agora tantas músicas e a consagração que sabemos. Durante o documentário vamos ouvir Chico cantando e algumas  sendo interpretadas por cantores escolhidos a dedo.

Carminho canta “Sabiá” com intensidade, como se fosse um fado e a gente escuta as vaias, porque o público do festival no Maracanã queria música engajada. Estávamos em plena ditadura e dói o coração ver o rosto magoado de Chico, ao lado de Tom, autor da música, escutando os gritos de revolta pelo primeiro lugar deles.

Depois, Tom falando de Chico com carinho e admiração. A tragédia da censura e “Roda Viva”.

E, de repente, surge o irmão alemão, mencionado por Manuel Bandeira em 1967, na cobertura de Rubem Braga:

“- Você não sabia? Seu pai teve aquele filho…”

Chico levou a pergunta para casa mas nada foi esclarecido. O documentário vai se encarregar de mostrar algo surpreendente.

É precioso o depoimento de Chico sobre a ex-mulher Marieta, os anos de auto-exílio na Itália, a chegada da primeira filha, a falta de dinheiro.

Chico conta as histórias com humor, ri muito também, mas sabe ser sério e reflexivo quando o momento exige. E é muito doce com os netos.

E desfilam, frente aos nossos olhos, Maria Bethânia jovem cantando “Olhos nos Olhos”, Monica Salmaso “Mar e Lua”, Laila Garin com “Uma Canção Desnaturada” de dar nó na garganta, volta Carminho com Milton Nascimento e “Sobre Todas as Coisas”, Adriana Calcanhoto e Mart’nália, brejeiras, num dueto em “Biscate” e Caetano e Chico no violão, cantando juntos.

Tudo delicioso. Uma ilha de beleza e inteligência nesse mundo atrapalhado de hoje em dia.

Assistir “Chico – Artista Brasileiro” é um privilégio. Não percam.

 

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Persuasão

“Persuasão”- “Persuasion”, Estados Unidos, 2022

Direção: Carrie Cracknell

Aquele par apaixonado, aos beijos no alto de uma falésia, com um tapete verde de grama alta envolvendo os dois, é a primeira cena atraente do filme dirigido pela inglesa Carrie Cracknell, baseado no último livro de Jane Austen, de 1816.

Entretanto, Anne Elliot (Dakota Johnson) e Frederick Wentworth  (Cosmo Jarvis) vão ter que se separar porque o marinheiro que ela ama, não tem título nem fortuna. Anne é persuadida, aos 20 anos, a terminar o romance sem futuro. Os que a cercam não aprovam esse casamento e ela aceita os argumentos da família.

Vamos voltar a vê-la aos 28 anos, para a época uma quase solteirona, com um coelho nos braços, contando para a plateia sua miséria. Não esqueceu o marinheiro.

Sim. Anne fala às vezes com o público. Toque de teatro moderno, num desrespeito pela quarta parede, incluido no filme pela diretora que já assinou várias peças de sucesso. E a atriz faz isso com muita graça.

Aliás Dakota Johnson está muito bela, com os cabelos presos quase que o tempo todo e vestida, como todo o elenco, de maneira sóbria. Não estamos vendo um filme na linha de “Bridgerton” nem “Emma”, o que faz que notemos mais as interpretações, a direção e a bela fotografia de Joe Anderson.

Alguns pedem mais autenticidade. Queriam uma Anne magra e abatida. Mas essa não é a ideia da diretora que traz Dakota Johnson respirando sensualidade no seu olhar verde e boca bem desenhada. Os que conhecem melhor o romance que foi escrito por Jane Austen um ano antes de sua morte, não gostam de adaptações e criticam o jeito dos personagens, muito atuais. Outros ao contrário, gostam da modernização.

O filme se passa em belos cenários já que a família à beira da falência tem que mudar-se de sua casa em Londres, Kellynch Hall, e ir para Bath onde a vida é mais barata. A mansão é alugada pela irmã do marinheiro, tornado Capitão enriquecido que, claro, vai aparecer novamente e não vai perdoar Anne com facilidade.

Numa excursão a Lyme, na bela praia deserta e fria, Anne e Frederick se aproximam mas o orgulho e a falta de confiança entre os dois vai render encontros e desencontros.

É um bom entretenimento com boas atuações. Mas anotem. Dakota Jonhson é a melhor coisa de “Persuasão”.

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