Um Crime Perfeito

“Um Crime Perfeito”- “A Perfect Murder”, Estados Unidos, 1998

Direção: Andrew Davis

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Entramos pelas janelas de um “loft” em Nova York, que é um ateliê de pintor. Espalhadas no espaço em cavaletes, outras no chão, numa mistura agradável, as obras do pintor convivem com materiais que ele usa em seu trabalho como tintas, solventes, pincéis. Mas ele não está trabalhando. Na cama, um casal faz amor. Não vemos os rostos. Só as joias dela na mesinha ao lado.

Agora é o Central Park e a câmara acompanha quem adivinhamos ser a companhia do pintor. Num casaco elegante, ela caminha pela calçada, cabelo louros bem cortados, maquiagem suave e as joias que já vimos.

Ela entra num rico apartamento. Móveis antigos, veludos, sedas macias e arte nas altas paredes.

Emily Taylor (Gwyneth Paltrow) surpreende-se com a presença do marido Steven (Michael Douglas), que acreditava estar num jantar com clientes. Ele é um grande investidor da Bolsa. Está vestido num “smoking” alinhado e a saúda com um “dry martini”:

“- Aos momentos roubados…”

“- Mudou de ideia? Pensei que não iríamos…”

“- Meus investidores ingleses perderam o avião. ”

E depois de um momento, onde ela sai para se vestir também, ele a segue. Ela está no telefone mas desliga quando o vê entrar em seu quarto de vestir. Diz algo sobre papéis que esqueceu em sua mesa na ONU, onde trabalha e pega um vestido do armário.

“- Prefiro este”, diz ele, autoritário, passando o cabide com um longo. Ela obedece mas deixa transparecer contrariedade.

Chegam ao Metropolitan Museum para a noite beneficiente e os fotógrafos a cercam. São “beautiful people”, como chamam os colunáveis.

Ela, com um colar de brilhantes discreto, tem os cabelos num coque que realça o belo pescoço, e é elogiada pelas mulheres atentas.

Ela se afasta do grupo e procura quem sabemos. Quando o encontra trocam olhares interrogativos:

“- Disse que não vinha…”

“- Ele mudou de ideia. Não consegui te avisar…”

Ele é David (Viggo Mortensen) com quem ela passou a tarde. Alto, cabelos longos, rosto atraente.

São esses os personagens da trama do filme que inclui o triângulo amoroso e crime.

Ainda não sabemos mas ela é uma rica herdeira e o marido passa por dificuldades financeiras.

“Um Crime Perfeito” é uma adaptação de um clássico de Alfred Hitchcock de 1954, estrelado por Grace Kelly, Ray Milland e Robert Cummings que, por sua vez era uma adaptação de uma peça de sucesso na Broadway escrita por Robert Burks.

Com um bom roteiro de Patrick Smith Kelly, atores talentosos e um visual atraente, “Um Crime Perfeito” tem suspense num crescendo e reviravoltas que surpreendem o espectador.

Andrew Davis conseguiu uma boa direção, muito diferente da de Hitchcock. Melhor assim porque tentar copiar um gênio nunca dá certo.

O Retorno de Ben

“O Retorno de Ben” – “Ben is Back”, Estados Unidos, 2018

Direção: Peter Hedge

Qual mãe ou pai de adolescente não teme que seu filho ou filha seja atraído pelas drogas? Há uma epidemia mundial de jovens drogados, morrendo cedo, entrando e saindo de clínicas de reabilitação e pior, presos em cárceres escuros. O que pode fazer uma pobre mãe ou pai?

Dois filmes me impressionaram no tratamento sensível e nada meloso com que mostraram esse problema. Um foi “Querido Menino” de Felix Van Groeningen com Steve Carell e Thimothée Chalamet, uma história real e “O Retorno de Ben”.

Esse último acaba de ser lançado no Brasil e certamente muita gente vai ver, atraídos pelo nome da estrela do filme, Julia Roberts.

Tudo se passa numa cidade pequena americana, coberta de neve. É quase Natal.

Holly (Julia Roberts) levou seus dois filhos menores, um de ovelha e a outra de estrelinha, para ensaiar o presépio na igreja. A filha maior, Ivy (Kathryn Newton), do primeiro casamento de Holly, com sua bela voz, canta com o coro.

Na volta para a casa, uma visita inesperada está na frente da porta:

“- É seu irmão mais velho”, exclama Holly, olhando para Ben (Lucas Hedge), que chega para passar o Natal com eles.

Mas há algo errado no ar, uma crispação nos olhos da irmã, um sorriso meio preso no rosto da mãe.

Só começamos a compreender melhor o que acontece quando, depois de uma conversa forçada na cozinha, a mãe recolhe todos os remédios de prescrição que encontra nos banheiros, pega também suas joias e esconde tudo no meio das toalhas da rouparia.

Quando chega o marido de Holly (Courtney B. Vance), avisado por Ivy do que acontecia, vemos que está sério e preocupado:

“- Não entendo você aqui. Terapeutas, médicos e até você mesmo concordaram que ainda é muito cedo para você visitar a família no Natal. Há muitas tentações para você e gatilhos perigosos. ”

E só para Holly ele, que é negro, diz:

“ Se ele fosse negro, estaria na prisão. “

Sem ter consciência do que está acontecendo, Ponce, o cachorrinho da família, está eufórico. Late e pula pela casa, fazendo farra com Ben e os dois pequenos. Na segunda parte da história, o cãozinho vai servir para aproximar Holly de descobertas terríveis sobre o passado do filho.

A mãe está dividida nesse primeiro momento. Alegre por ter a companhia do filho e, ao mesmo tempo, concordando com o marido e a filha, que ele tem que ser vigiado.

Julia Roberts está esplêndida no papel de mãe de um drogado, mostrando em seu rosto bonito o conflito de amar e não poder ajudar um filho perdido para a droga. Ela é forçada a sair de uma negação defensiva, querendo acreditar que ele mudou e ao mesmo tempo não podendo deixar de perceber as mentiras e a farsa que ele encena.

Lucas Hedge (“Manchester à beira mar”), filho do diretor e roteirista Peter Hedge na vida real, está também muito bem mas a estrela aqui é Julia Roberts, num papel perfeito para mais uma indicação ao Oscar. Merecida.