O Confeiteiro

“O Confeiteiro”- “The Cakemaker”, Alemanha, Israel, 2018

Direção: Ofir Raul Graizer

Oferecimento Arezzo

Estamos em Berlim e Oren, que vive em Jerusalém, cada vez que visita a cidade a trabalho, gosta de ir no Kredenz Café e pedir o bolo de chocolate Black Forest. Sem esquecer de comprar biscoitos de baunilha para levar.

Um dia, Oren (Roy Miller) pergunta a Thomas (Tim Kalkhof), o jovem dono do café, se ele teria uma sugestão para o presente de aniversário do filho dele. Thomas sugere um trem e se oferece para levar Oren à loja que ele conhece.

Os dois descobrem que tem muito em comum, já que um ano depois, toda vez que Oren vem a Berlim, hospeda-se com Thomas. A câmera é discreta mas percebemos o quanto um gosta da companhia do outro.

Oren não esconde que tem família, mulher e um filho, em Jerusalém. E conta que Anat (Sarah Adler) vai abrir um café.

Thomas que fora criado pela avó, longe de Berlim, porque sua mãe morrera cedo, estava acostumado a ser só e valorizava a única vinda de Oren, uma vez por mês.

Quando Oren vai embora esquecendo as chaves e os biscoitos, Thomas se preocupa e liga no celular dele. Mas só dá caixa postal e ele deixa recados.

E Thomas não sossega, quer notícias. E vai ao trabalho de Oren. Chocado ouve que Oren morreu num acidente em Jerusalém.

Quando Thomas se decide a ir para Jerusalém, com passagem só de ida, ficamos apreensivos, tanto por ele quanto pela viúva. Por que ele quer ficar próximo do mundo de Oren? O luto é um sentimento complicado.

Vai ao café de Anat, pobre e sem graça, com comida kosher para ter o certificado religioso de funcionamento. Mal paga as contas. Mas depois de alguma insistência, tudo vai mudar quando Thomas é contratado e vira o confeiteiro.

Mas e o perigo de Anat descobrir tudo? Parece que Thomas não pensa nisso. Ele quer ocupar o lugar de Oren? O mesmo desejo inspira Anat a vesti-lo com as roupas do marido?

Thomas sonha com Oren e dorme com a sunga dele, deixada no Centro Esportivo. A chave esquecida abriu o armário.

Nada é dito claramente mas pode ser que a mãe de Oren tenha intuído a verdade sobre Thomas e o filho Oren. Mas ela gosta dele. Cozinham juntos e se dão bem.

Thomas, que não teve mãe mas avó, gosta do ambiente feminino de uma cozinha onde sabe o que fazer. Ele é principalmente muito carente. Alguém que é solitário mais por timidez que por escolha.

Muitas perguntas vão ficar no ar com esse primeiro filme de Ofir Raul Graizer. Mas o roteiro escrito por ele permite ao espectador que pense em tais questões, que não precisam se ater a uma única reposta.

E essa fluidez de territórios no preenchimento das carências humanas abriga melhor os personagens dessa história. Thomas e Anat não seguem regras? Não devem ser os únicos nesse mundo complexo em que vivemos.

Sementes Podres

“Sementes Podres”- “Mauvaises Herbes”- “Bad Seeds”, França, 2018 NETFLIX

Direção: Kheiron Tabib

Dois cúmplices inesperados roubam, com engenho, as compras de supermercado de velhinhos desavisados. Bem, nem tão velhos assim, porque conseguem correr atrás do jovem Wael (Kheiron) que simula roubar a bolsa de Monique (Catherine Deneuve), distraindo assim o bem intencionado que quer recuperar a bolsa, enquanto ela foge com tudo do carrinho dele.

Até um dia que o golpe dá errado porque Monique é reconhecida por Victor (André Dussolier) que foi seu amigo na juventude. Ele convida os dois para trabalhar com ele, ajudando estudantes que não se comportaram bem na escola, faltaram muito ou foram pegos com armas. É uma segunda chance de reeducação durante as férias, apoiada pelo governo.

O diretor e ator Kheiron Tabib, 36 anos, em seu segundo longa (“Nous Trois ou Rien” 2015) escreve também o roteiro, utilizando memórias de sua própria vida. Ele nasceu no Irã e veio para a França com a família para fugir da revolução dos aiatolás.

Seu olhar de simpatia, bom humor e compreensão para com os adolescentes imigrantes ou filhos de imigrantes faz toda a diferença na vida deles.

Catherine Deneuve, a eterna musa do cinema francês, desapega de seus papéis de dama aristocrática e faz uma senhora que vive na periferia com Wael, por quem tem um carinho enorme. Vivem juntos e ela quer que ele consiga melhorar de vida, apostando em seu talento e bom coração. Em “flashbacks”, a história dos dois é contada.

Mas na tradução do título original, “Mauvaises Herbes”, foi preterido e foi escolhido o título em inglês, “Bad Seeds”, que se aprimorou aqui em “Sementes Podres”. Nada mais longe da intenção do roteirista, diretor e ator do filme, Kheiron, que usou uma frase de Victor Hugo (1802-1885), famoso escritor francês de “Les Misérables”, como epígrafe para seu filme:

“Não há nem ervas daninhas, nem homens maus. Há sim, maus cultivadores.”

Como podem ver, Hugo não fala em sementes, nem más nem muito menos podres. Falou de ervas daninhas, que o bom jardineiro arranca para não prejudicar o crescimento das sementes boas. É o trabalho do educador que estimula as qualidades do aluno, cuidando para que ele cresça, amadureça.

O filme é um conto não moralista mas que aponta para a esperança como a qualidade principal para um educador. Merece ser visto.