Paris Pode Esperar

“Paris Pode Esperar”- “Paris Can Wait”, Estados Unidos, 2016

Direção: Eleanor Coppola

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Fazer cinema, para quem convive com talentos imensos e reconhecidos, deve ser uma experiência tentadora.

Mas Eleanor Coppola, mulher de Francis Ford Coppola e mãe de Sofia e Roman, só experimentou fazer seu primeiro longa de ficção aos 80 anos. Seu documentário sobre o marido, “Francis Ford Coppola – O Apocalipse de um Cineasta” de 1991 foi muito elogiado. Mas e a coragem para fazer ficção? Acho que ela também pensou: mas se não for agora, quando?

E o dinheiro? Quem investe hoje em dia num filme com personagens de mais de 50 anos e sem reviravoltas e brigas na trama? Eleanor confessou em entrevista que teve dificuldades para encontrar financiamento para seu filme. No fim, o marido ajudou.

E o resultado agrada a quem gosta de “road movie” sofisticado. Os que apreciam a região da Provence vão rever lugares visitados e os que não conhecem, mas gostam de viajar de carro e tem afinidade com a cozinha, os queijos e os vinhos franceses, vão poder se inspirar para a sua própria viagem de sonho.

E é interessante saber que o roteiro foi baseado numa experiência pessoal da diretora. Conta ela que o episódio é verdadeiro. Estava no Festival de Cannes com o marido em 2006, quando uma dor de ouvido impediu que voasse para Budapeste e ela foi para Paris, levada por um sócio de Coppola.

A bela e charmosa Diane Lane, 52 anos, é a personagem que faz a diretora. Alec Baldwin, 59, é o marido e Arnaud Viard, 51, é o sócio francês que acompanha a americana casada na viagem para Paris, que durou dois dias ao invés das sete horas previstas.

Pensar que ela buscava uma aventura é algo vulgar. Porque Anne ama o marido, o produtor de cinema famoso que vive trabalhando, envolvido nos filmes rodados nos quatro cantos do mundo. E sobra pouco tempo para ela, que sonha com uma viagem só dos dois.

Então, enquanto não dá para ter o marido, Anne aprecia que Clément comprou remédio para sua dor de ouvido e a leva para um restaurante lindo antes de começar a viagem. Retraída, ela não quer vinho mas quando chega o Chateau Neuf du Pape, o belo “rouge” brilhando nos copos de cristal, ela muda de ideia.

Aos poucos, os viajantes vão ficando mais próximos. Nada como uma bela paisagem e surpresas como um piquenique na grama perto do rio, para aproximar as pessoas.

Ela gosta de fotografar e Clément se interessa pelas fotos e elogia o seu talento para o detalhe.

Ou seja, Anne estava carente disso tudo que faz da vida uma experiência única. Quando ela diz que sua flor preferida é a rosa, no próximo posto de gasolina, enquanto ela compra chocolate, ele vai e volta com o carro cheio de rosas esplêndidas e perfumadas.

No caminho visitam pequenos museus, ruinas romanas românticas e restaurantes escondidos com “chefs” maravilhosos que proporcionam surpresa e delícia para Anne.

Há sutileza e elegância durante todo o trajeto e por isso “Paris pode Esperar” encanta a plateia.

Um filme delicioso, em todos os sentidos. Não perca!

Neve Negra

“Neve Negra”- “Nieve Negra”, Argentina, Espanha, 2017

Direção: Martin Hodara

Como é difícil julgar algo ocorrido no passado com outras pessoas… Mesmo porque, até que um fato novo aconteça, não há interesse em remexer em velhos segredos. E é o que ocorre aqui, nessa família infeliz.

A cena inicial do filme é intrigante. Vemos alguém de costas, caminhando na neve com uma espingarda. Ouvimos uma voz chamar:

“- Juan? ”

E um menino de olhos claros se vira e encara quem chama. Essa cena traz o segredo escondido que agora vai emergir entre dois irmãos.

Salvador (Ricardo Darín, sempre estupendo) vive só, há 30 anos, numa montanha da Patagônia, que é sua reserva de caça particular. A propriedade familiar, num lugar ermo, guarda só o chalé, agora decrépito, onde moraram desde sempre. Mas por que ele parece um eremita, cabelos desgrenhados, jeito sujo, vivendo numa situação de quase penúria? Seu rosto exprime desgosto e raiva.

Marcos e Laura, o irmão de Salvador e sua mulher grávida (Leonardo Sbaraglia e Laia Costa, atriz espanhola), chegam à Argentina para enterrar o pai dele e ficam sabendo que, numa carta do pai, há um pedido para que Marcos o enterre ao lado de Juan, seu filho caçula, morto há muito tempo atrás, na montanha.

Entendemos que Salvador, Marcos e Juan são irmãos e que há uma irmã (Dolores Fonzi, numa ponta marcante) internada numa clínica psiquiátrica. Da mãe não sabemos nada.

O velho amigo e advogado do pai (Federico Luppi) conversa com Marcos sobre a oferta de 9 milhões de dólares para a compra da propriedade familiar pelos canadenses. Falta a assinatura de Salvador.

“- Já disse que não falo com ele”, responde Marcos, ríspido.

Laura fica surpresa sobre a quantia oferecida, que viria a calhar para pagar as despesas com a cunhada na clínica e o bebê a caminho. Ela sabe muito pouco sobre a família do marido.

Marcos e Laura vão levar a urna funerária até a montanha, como era desejo do pai.

O filme foi rodado em Andorra, nas montanhas com pinheiros escuros, neblina e tempestades de neve. O clima é propício para a trama que tem buracos negros, com um segredo sobre o qual não se fala.

A fotografia é bela e triste. A música poderosa e lúgubre. Tudo concorre para que a plateia seja seduzida para querer saber mais sobre aquela família, da qual restam dois irmãos em litígio mudo e uma irmã louca tirada de cena.

O suspense vai sendo alimentado por cenas em “flashback” que mais parecem sonhos, recordações, lembranças vívidas, que são como que fantasmas que perseguem Marcos e Salvador.

O final é surpreendente.

“Neve Negra”, com um ótimo elenco, é mais um sucesso do cinema argentino.