Oslo, 31 de Agosto

“Oslo, 31 de Agosto”- “Oslo, 31 August” Noruega, 2011

Direção: Joachim Trier

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Quando uma pessoa procura a auto-destruição e ela se empenha nisso, sempre consegue o que busca.

Mas há um longo caminho a ser percorrido e os que amam e querem ajudar aquela pessoa vão desistindo aos poucos.

No caso do personagem do filme, ele escolhe as drogas. Heroína, anfetaminas, cocaína, maconha. Todas.

Vamos assistir ao último dia de Anders.

Teve uma noite livre da clínica de reabilitação onde está internado e passou a noite com uma garota. Mas, desde que sai do apartamento dela, tenta ser radical. Pedras nos bolsos, entra no lago. Mas desiste. Tirou da cabeça? Parece que antes ele tem que fazer algo.

Tem uma entrevista para um emprego nesse dia. E, no caminho, passa pela casa de um amigo.

A filha pequena desse amigo desenha um ogro quando vê Anders chegar. E olha desconfiada para ele.

O pai brinca, tenta explicar que o amigo largou as drogas mas criança não se engana.

Algo desumano cresce a olhos vistos naquele rapaz de 34 anos, bonito, magro, com um rosto sem expressão.

“- Então Anders? Esteve com Malin? Que tal? Você já dormiu com tantas suecas!”

“- Difícil dizer…Eu não estava lá…”

Ele ausentou-se de tudo. Mas o que quer ainda?

“ – Me lembro de você falando: se alguém quer se destruir, é permitido.”

E, por mais que o amigo tente, ele derruba, um a um, seus argumentos a favor da vida. Parece que tem um prazer perverso nisso.

“- Ninguém precisa de mim… Não de verdade…Só quero que você entenda. Se eu terminar com tudo, será porque eu quero assim.”

“- Não posso ouvir você dizer assim desse jeito que vai se suicidar! E seus pais? “

“- Ia parecer uma overdose. Acontece todos os dias.”

“- Qual é? Você já passou por isso antes”, encoraja o amigo.

“- Tudo vai se arranjar” diz Anders sorrindo irônico. E completa a frase:

“- Só que não é verdade.”

Conversam mais um pouco e ele consegue deixar o amigo deprimido e culpado.

Na despedida se abraçam e o amigo fala:

“- Você não vai fazer nenhuma besteira? Eu ficaria muito mal.”

“- Prometo”, responde Anders, sem convicção.

E vai, deixando o amigo aflito.

Seu percurso é semeado por gente que ele perturba.

Na entrevista consegue falar mal do jornal que quer empregá-lo e confessa que é drogado. Sai antes que o outro possa mudar de ideia.

A própria irmã não quer vê-lo.

Num club noturno diz para uma desconhecida que pergunta o que ele faz:

“- Procuro compaixão…”

Tenta falar com a ex mas ela não retorna suas insistentes ligações. E ouve de um rapaz a quem ele aborda para pedir perdão:

“- Não é da sua conta se eu tive ou não um caso com sua ex. Não conheço você mas sei como trata as pessoas a seu redor. Não quero seu perdão. Você é um viciado…”

Parece que esse foi o único que Anders não conseguiu enganar.

Ele liga para Iselin e diz que foi uma pena ela não querer ouvir seu último recado e segue o seu caminho anunciado. É a manhã do dia 31 de agosto.

O diretor Joachim Trier, no seu segundo filme, faz uma homenagem à “Nouvelle Vague” francesa, inspirando-se para o roteiro no livro “Le Feu Follet”, de Pierre Drieu La Rochelle de 1931, que foi adaptado por Louis Malle em 1963 no seu filme “The Fire Within”. Em comum, o tema do suicídio.

“Oslo, 31 de Agosto” tem uma interpretação impecável de Anders Danielsen Lie e é um filme que nos alerta sobre os perigos que rondam a vida, quando nos entregamos à auto-compaixão e ao ódio aos que querem nos abrir os olhos.

 

O Enigma Chinês

“O Enigma Chinês”- “Casse-tête Chinois”, França/Bélgica/ Estados Unidos, 2013

Direção: Cédric Klapish

Cada etapa da vida tem complicações diferentes. Pelo menos é o que chegamos à conclusão, depois que superamos as quatro primeiras décadas de existência. Já sabemos, a essas alturas, que tudo depende de como fazemos nossas escolhas, e da sorte e talento com que lidamos com o acaso e os imprevistos provocados pelos outros. E já não cobramos uma existência linear. Aprendemos a lidar com os altos e baixos e com as curvas do caminho. Bem, quase todos nós.

O escritor francês de 40 anos, Xavier (Romain Duris), por exemplo, acha que sua vida fica cada vez mais complicada e sonha com a linearidade de uma reta que conduza de A para B. Para ele, linearidade rima com felicidade. Ele quer casamento, amor, filhos, livros, amigos e basta.

Seu editor, que aparece pelo Skype para saber a quantas anda o livro que ele escreve no momento, pontifica:

“- A felicidade não interessa para a literatura.”

“ – Mas eu estou falando da vida”, geme Xavier.

“ – E eu, da narrativa literária.”

O caso é que Xavier está separado de Wendy (a bela Kelly Reilly) com quem tem dois filhos e foi casado por 10 anos. E isso aconteceu porque ele resolveu ajudar a amiga Isabelle (Cécile de France), lésbica que queria um bebê, a engravidar, com seu esperma doado.

O casamento que já não ia bem, acabou e Wendy levou os dois filhos do casal para Nova York, onde ela foi morar com John (Peter Hermann), alto, rico e bonitão.

Xavier ouve de sua mãe:

“- Mas você vai repetir o erro que eu e seu pai fizemos? E as crianças? Não vá fazer o que seu pai fez com você!”

E lá vai ele para Nova York, para ficar perto dos filhos. E implicar com Wendy desde o momento em que conheceu John.

E com quem ele mora? Foi se abrigar com a dupla Isabelle e Ju, mães do outro filho dele.

Audrey Tautou também aparece, adorável, falando chinês correntemente.

Cédric Kaplich encerra com “Enigma Chinês” ( não é enigma mas sim quebra-cabeças ou “puzzle”, na tradução correta do título), a trilogia que ele começou com os mesmos atores e personagens em “Albergue Espanhol” 2002 e “Bonecas Russas”2005. Mas não é necessário ter visto os dois primeiros para entender o último.

“Enigma Chinês” é leve e divertido e sua narrativa não é linear. As peças vão se encaixando aos poucos, no decorrer da história.

O filme fala de uma geração que está com 40 anos e valoriza os filhos, frutos principalmente de casamentos já desfeitos. Há um sub-texto que trata da nostalgia da durabilidade dos laços afetivos e da força do amor na vida das pessoas.

Mas “Enigma Chinês” ri até quando filosofa. Hegel e Schopenhauer, personagens do filme, que o digam.