Elena

“Elena” Brasil, 2011

Direção: Petra Costa

Oferecimento Arezzo

Ela é uma sombra no chão. Filma imagens fugidias. Nelas, procura traduzir uma busca da verdade sobre si mesma.

“- Sonhei com você nessa noite, Elena…”, assim começa seu documentário a diretora Petra Costa, 29 anos.

É um diálogo com a irmã Elena, que vive em sua memória, indagando o porquê daquilo que aconteceu.

Parece que o filme, feito de pedaços de filminhos caseiros, gravações da voz da própria Elena, seus diários e vídeos, depoimentos da mãe das duas e associações que a diretora faz a partir de lembranças afetivas da irmã, vai conseguir salvá-la do mesmo destino trágico.

Colocando em imagens essa história, ela resgata o que de belo e amoroso existia em Elena, que tinha dito para a mãe que tinha um vazio enorme no peito. E que queria morrer.

Então, como são preciosos para Petra, 13 anos mais nova que Elena, esses momentos resgatados nos arquivos da família, onde as duas dançam. Ela, pequena, no colo da irmã. Ou então quando dorme a seu lado, cabeça com cabeça, ela um bebê de chupeta e Elena mocinha de 13 anos.

A mãe é uma referência mútua, a “nossa mãe”, como diz Petra, que narra o filme em “off”. Também ela queria ser atriz, foi militante nos anos da ditadura e separou-se do pai das duas quando Petra tinha 15 anos.

Elena foi para Nova York em 1990, com 20 anos. Queria trabalhar no cinema. Era excessivamente exigente consigo mesma e parece que, apesar de bela e de gostar de dançar, traz nela algo que Petra pressente, que também vê na mãe e se assusta em pensar que não vai saber lidar com aquilo em si mesma.

“- Pouco a pouco você começa a se distanciar”, diz ela para a irmã que não está mais presente.

A bela Elena arrasta consigo aquele vazio que disse sentir no peito e se cobra muito:

“- Se não consigo fazer arte, melhor morrer”, ouve dela a mãe.

Os sinais de fragilidade na existência de Elena vão se compondo numa depressão que Petra não quer explicar, nem viver.

Perder quem se ama é insuportável. Frente a um suicídio, o trabalho de luto longo e doloroso, a culpa que sempre existe contra toda e qualquer evidência em contrário, mas principalmente o medo de ser levada a um mesmo destino, são os temas universais da narrativa de Petra que faz com que uma identificação com ela seja obrigatória.

Parece que a libertação torna-se possível quando Petra consegue inserir-se numa procissão de mulheres levadas e lavadas por uma água transparente, de olhos fechados, pacificadas. Ser humana e mulher é o destino de todas elas.

Petra Costa faz desse diálogo com a irmã morta uma obra comovente e vital, com poderes curativos. Arte serve também para isso.

A Datilógrafa

“A Datilógrafa”- “Populaire”, França 2012

Direção: Régis Ronsard

Deliciosa. Aliás há mais adjetivos para qualificar essa comédia romântica francesa, charmosa, antiguinha, divertida, previsível e com um final feliz, como devem ser as comédias que falam do amor.

Quando o filme começa, distinguimos no lusco-fusco de um depósito de uma loja, uma máquina de escrever, daquelas que existiam antes dos computadores. E uma mocinha de uns 20 anos, cuidadosamente acaricia suas teclas. Põe o papel na máquina e escreve algo, “catando milho” ou seja, só com dois dedos.

Ela sonha enquanto lê seu nome impresso na folha: Rose Pamphyle.

Entram os créditos no estilo dos anos 50 e uma música animada lembra os filmes que a gente via com Doris Day e Rock Hudson.

Mas no desenho final, um toque extra de sofisticação, faz lembrar que aquelas pernas, o vestido e o sapato de salto vermelhos com o fundo negro, sinalizam que só podemos estar na França.

Aquela mocinha (Déborah François), sonhava em deixar a província onde vivia para conquistar o disputado posto a que muita mulher almejava na época: ser uma secretária. Porque são elas que cuidam do patrão e algumas até se casam com eles? Não para Rose, que diz:

“- Ser secretária é moderno!”

Na sala onde as candidatas ao emprego de secretária de Louis Échard (Romain Durin) discutem as qualidades que deve ter uma boa secretária, Rose se destaca. É a mais bonita, com sua franjinha, rabo de cavalo e o ar um pouco petulante.

Vai ser seu talento com a máquina de escrever que a levará a lugares nunca antes sonhados por ela.

Seu patrão, esportista de alguns troféus na juventude, convocado para a guerra, tornou-se deprimido e inseguro depois dela. Não se casou com a moça que amava (Bérénice Béjo, numa ponta com talento), esposa agora de seu melhor amigo. E já que não consegue fazer nada por si mesmo, ele precisa ajudar alguém a ser o que a pessoa é, mas não desconfia.

E Rose é a escolhida. Mal sabe ele que também está atraído por outras qualidades dela, que ele finge não perceber.

Uma releitura do espírito de “My Fair Lady” e o embate de Eliza com o Professor Higgins? Pois é. O filme faz, de propósito, alusão a várias comédias românticas que já vimos no cinema.

Rose é uma mistura de Audrey Hepburn e Grace Kelly com toques de Natalie Portman. E como é encantadora quando luta pelo que quer e se apaixona perdidamente, como todas as mocinhas de filmes de amor.

A química entre os protagonistas é palpável. A cena da dança na noite de Natal coloca um sorriso no rosto do mais carrancudo dos espectadores.

E tem os concursos de velocidade na datilografia em que Rose tem que mostrar ao mundo a que veio. Verdadeiras maratonas com suspense.

Régis Ronsard acertou em cheio em seu primeiro longa, já que agradou até a Harvey Weinstein (o Midas do cinema) que já comprou os direitos do filme.

Não perca tempo. Corra para se divertir e se encantar com “A Datilógrafa”. Você vai me agradecer o conselho.