Ainda Estou Aqui

“Ainda Estou Aqui” – Brasil, 2024

Direção: Direção: Walter Salles

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Era uma tarde de verão com céu azul e a família Paiva se preparava para o almoço depois da praia. Rubens Paiva (Selton Mello), deputado cassado pelo regime militar e Eunice Paiva (Fernanda Torres), mãe de quatro meninas e um menino, eram uma família alegre e unida. Aquela casa no Leblon, de frente para o mar, estava sempre de portas abertas para os amigos.

Mas naquele dia não eram amigos que batiam à porta. Tipos mau encarados perguntavam por Rubens. Mas por que? Indaga Eunice. Prestar depoimentos, responde um deles.

Aquilo surpreendeu a família. Eunice tentou abafar o susto dizendo que o pai voltaria para o jantar.

Era o ano 1971 e a ditadura ficava cada vez mais agressiva. Pessoas desapareciam da noite para o dia. O perigo era real.

Rubens não volta e Nice foi levada também. Lá era obrigada a folhear um álbum de retratos para reconhecer pessoas.

Para seu espanto o marido, a filha mais velha e ela mesma estavam naqueles álbuns. Ouviam-se gritos nos corredores.

Humilhada, cansada, destruída, depois de dias na prisão, ela ainda tem forças para dizer que o pai voltará e leva as crianças para tomar sorvete.

E Nice aguenta o pior, protegendo os filhos e se mudando para São Paulo. A família dela morava lá. Ela precisava de ajuda porque resolveu fazer a Faculdade de Direito. Torna-se defensora dos indígenas espoliados de suas terras pela Transamazônica.

Fernanda Torres transfigura-se na tela. Sua Nice é o centro do filme. A atriz a faz corajosa, mas sempre  protegendo os filhos com doçura e sabendo conduzir a família para longe daquele cenário trágico no Rio. Mas ela não desiste de lutar pela certidão de óbito do marido. A força da interpretação de Fernanda Torres merece aplausos e prêmios.

A direção primorosa de Walter Salles faz de seu filme uma lição de política, na defesa que faz dos direitos humanos maltratados. Com a mão leve, Walter Salles comove e não resvala para a facilidade de um dramalhão.

O final do filme, na passagem dos créditos, mostra a casa vazia, Nice andando pelos cômodos enquanto se despede da felicidade que ali viveu. O vazio da casa é também o vazio que se abriu na história daquela família. A ausência de Rubens é um vazio que vai levar essa mulher guerreira a sofrer mas também a enfrentar essa desolação com coragem.

A última imagem, poderosa e comovente, são os olhos vazios de Nice, aos 80 anos, interpretada por Fernanda Montenegro. Sem palavras inúteis.

Baseado no livro de Marcelo Rubens Paiva, o filme foi premiado em Veneza pelo roteiro e vai   representar o Brasil no Oscar.

Belo filme.

A Melhor Cartada

“A Melhor Cartada”- “Do Patti”, “Índia, 2024

Direção: Shashanka Chaturvedi

O filme trata de um crime comum na Índia. Infelizmente, muitas mulheres enfrentam violência doméstica e se calam. Por que?

As mulheres que sofrem com esse crime não acreditam na justiça dos tribunais, que não quer ver o que está na frente dos olhos de todos. A mulher é tratada de maneira diferente do modo com que julgam os homens.

Em “A Melhor Cartada” porém, a inspetora policial que cuida do caso é corajosa e muito competente. Ela vai fundo na investigação e não tem medo de homem.

Seguindo a tradição indiana, o filme tem cantos e  danças inseridos na narrativa. E fala sobre a vida de um par de gêmeas, belíssimas mulheres. Uma delas é tímida e amedrontada, a outra é forte e  aventureira. São diferentes desde a infância.

A irmã mais tímida casa-se com o homem que a irmã também cobiça e é aí que começam as confusões. Uma cena numa asa delta com uma das irmãs quase acaba em tragédia.

O roteiro é inteligente e guarda surpresas que levam o espectador a se perguntar sobre a verdade do que está acontecendo.

“A Melhor Cartada” mostra que os filmes indianos, que são as maiores bilheterias do mundo, porque lá é costume ir muito ao cinema, pode agradar também a nós ocidentais.